Eduardo Ribeiro Mundim
“Mito é algo que nunca
existiu, mas que existe sempre”. Esta definição, da
autoria de
Joseph
Campbell, serve de introdução ao texto Marcelo Gleiser, à
página 9 do Caderno Mais, da edição de 11 de abril de 2010 do
Jornal Folha de
São Paulo. Baseado nela, aponta para a natureza
narrativa-explicativa do mito,
que não se funda na verdade mas na
sua eficiência. O da superioridade ariana
da Alemanha nazista, por
exemplo. Ao funcionar, o mito seduz apelando para
as fraquezas e
medos, “oferecendo soluções, prometendo desenlaces
alternativos
aos dramas que nos afligem diariamente”.
A fé nos mitos mostra a
paixão do crente – nos últimos anos, os suicidas
árabes, e há
50, os kamikases japoneses (exemplos meus, não do autor). E
esta
paixão parece ser um obstáculo a atividade científica, pois
prescinde de
justificativa racional, enquanto esta se baseia
(idealmente) na objetividade das
observações e análise criteriosa
dos dados. Assim sendo, é acusada de destruir
a fé das pessoas, à
medida que esta, frequentemente, carece de bases
experimentais que
não sejam individuais.
Mas os progressos do
conhecimento organizado humano são compartilhados
por ambos,
crentes e cientistas. E este compartilhar sugere um fosso
separando
o uso da ciência e suas aplicações das implicações culturais e
religiosas. Para esta dicotomia, o radicalismo ateu, como o de
Richard
Dawkins, não é estratégia viável: extremistas religiosos não
mudam de
opinião, como o cientista honesto faz, quando confrontado
com novos dados
convincentes.
No lugar do ateísmo,
Gleiser propõe o agnosticismo. Na sua visão, aquele nega
categoricamente, enquanto este se recusa a negar radicalmente aquilo
que
não sabe.
Citando Carl Sagan,
lembra que a “ausência de evidência não é evidência de
ausência”. A incômoda, tanto para o crente quanto para o
cientista,
coexistência do existir e do não-existir parece ser
inevitável.
Termina com o seguinte
parágrafo: “apesar de o natural e o sobrenatural
serem
irreconciliáveis, é possível ser uma pessoa espiritualizada e
cética.
Einsten dizia que a busca do conhecimento científico é,
em essência, religiosa.
Essa religião é bem diferente da dos
ortodoxos, mas nos remete ao mesmo
lugar, o cosmo de onde viemos,
seja lá qual o nome que lhe demos.”
publicação original em www.medicinaeciencia.med.br/ciencia/mitoscienciaereligiosidade.pdf
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