sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

Mitos, ciência e religiosidade


Eduardo Ribeiro Mundim

“Mito é algo que nunca existiu, mas que existe sempre”. Esta definição, da autoria de Joseph Campbell, serve de introdução ao texto Marcelo Gleiser, à página 9 do Caderno Mais, da edição de 11 de abril de 2010 do Jornal Folha de São Paulo. Baseado nela, aponta para a natureza narrativa-explicativa do mito, que não se funda na verdade mas na sua eficiência. O da superioridade ariana da Alemanha nazista, por exemplo. Ao funcionar, o mito seduz apelando para as fraquezas e medos, “oferecendo soluções, prometendo desenlaces alternativos aos dramas que nos afligem diariamente”.

A fé nos mitos mostra a paixão do crente – nos últimos anos, os suicidas árabes, e há 50, os kamikases japoneses (exemplos meus, não do autor). E esta paixão parece ser um obstáculo a atividade científica, pois prescinde de justificativa racional, enquanto esta se baseia (idealmente) na objetividade das observações e análise criteriosa dos dados. Assim sendo, é acusada de destruir a fé das pessoas, à medida que esta, frequentemente, carece de bases experimentais que não sejam individuais.

Mas os progressos do conhecimento organizado humano são compartilhados por ambos, crentes e cientistas. E este compartilhar sugere um fosso separando o uso da ciência e suas aplicações das implicações culturais e religiosas. Para esta dicotomia, o radicalismo ateu, como o de Richard Dawkins, não é estratégia viável: extremistas religiosos não mudam de opinião, como o cientista honesto faz, quando confrontado com novos dados convincentes.

No lugar do ateísmo, Gleiser propõe o agnosticismo. Na sua visão, aquele nega categoricamente, enquanto este se recusa a negar radicalmente aquilo que não sabe.

Citando Carl Sagan, lembra que a “ausência de evidência não é evidência de ausência”. A incômoda, tanto para o crente quanto para o cientista, coexistência do existir e do não-existir parece ser inevitável.

Termina com o seguinte parágrafo: “apesar de o natural e o sobrenatural serem irreconciliáveis, é possível ser uma pessoa espiritualizada e cética. Einsten dizia que a busca do conhecimento científico é, em essência, religiosa. Essa religião é bem diferente da dos ortodoxos, mas nos remete ao mesmo lugar, o cosmo de onde viemos, seja lá qual o nome que lhe demos.”


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